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DESVER

FESTIVAL DE CINEMA 

UNIVERSITÁRIO

DE MATO GROSSO DO SUL

Foto do escritorHeloisa Montai

Um estudo sobre planos detalhes

Foi devido a longa-metragens que me interessei em estudar e produzir cinema, mas foi assistindo a curtas que, pela primeira vez, me vi apaixonada pelo cinema. Acredito fielmente que há histórias feitas para serem contadas em poucos minutos e que há técnicas que só podem ser abarcadas pelo curta. A ideia de um filme inteiro em plano detalhe, por exemplo, me soa mais possível dentro desse formato. Claro que A Paixão de Joana d'Arc é exímio em sua execução, mas eu não vejo outro longa se aventurando dessa forma nos dias de hoje. Nesse sentido, Eu, Eu Mesma e S(Eu) Afeto, me intrigou profundamente quando entendi sua ambição.

Entretanto, até que isso se elucidasse (que eu entendesse que realmente a técnica perduraria até o final), o filme não foi tão agradável. A fotografia preto e branco da primeira parte – intitulada “Eu” – é acompanhada de ações rotineiras muito longas, como uma cena de 40 segundos da personagem escovando os dentes ou a ação inteira de descascar uma laranja sob uma luz bonitinha. É perceptível a intenção de expor o estado monótono de rotina em que Gabriela se encontra, mas o tiro sai pela culatra na medida que se torna cansativo para o espectador o excesso de reafirmação dessa condição. Se ainda o uso dos planos detalhes não fosse tão clássico, sempre fixos e diretos ao ponto, postura que o filme assumirá na sequência, essa parte não pareceria tão sóbria.

Em “Eu Mesma”, parte dois do curta, pela qual tenho certa predileção em relação às outras, a direção de Giovanna Heroso se permite explorar mais as possibilidades do plano detalhe. Já em uma fotografia colorida, o curta atinge seu apogeu. A insistência em repetir sempre os mesmos objetos de atenção (os olhos das personagens e a mão da protagonista) interrompem a lógica espacial e temporal por algumas vezes. Principalmente na lembrança súbita de Gabriela da última vez em que pensou nos olhos da menina com a qual estuda e na troca de olhares em plano e contraplano que a sucede. O espaço entre ambas é reduzido, mas não rompido. A atração entre ambas é ampliada e a expectativa sufoca a atmosfera do filme com desejo.

O corte súbito do transe da interação entre as garotas para a introdução da estética da terceira parte do filme, S(Eu) Afeto, é a princípio uma quebra de expectativa sedutora. Entretanto, a partir disso o filme decai sobre um uso chulo, recordativo, de sua técnica. A sequência da festa se assemelha às amontoagens de vídeos de viagens sobre os quais se coloca uma trilha e posta-se nas redes sociais. É exibicionismo estético que se apresenta em escolhas de mise-en-scene com luzes neon e focos e desfoques constantes que não estão ali se não para coagir o espectador por sua beleza e simetria. Além disso, retiram a atenção da força magnética que une as duas personagens quando essas, finalmente, são enquadradas juntas. A atração que parecia ser maior que elas mesmas se torna apenas performática em uma coreografia muito sintética. Em nada se assemelha às partes anteriores que, mesmo diferentes, possuem coerência entre si e, mais ainda, sensibilidade.

Esse encerramento do curta, na verdade, parece o caracterizar mais como um estudo sobre planos detalhes em fotografias diferentes do que como um discurso narrativo coeso. Ainda nutro afeição pela sua ambição, mas seu perfeccionismo clássico atrapalha a si próprio quando interpolado por ruídos que apontam na direção oposta dessa linguagem.


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